Professora que imobilizou aluno dá detalhes do dia do crime - Notícias de Brasília

Page Nav

HIDE

Professora que imobilizou aluno dá detalhes do dia do crime

Responsável por parar o agressor e evitar uma tragédia ainda maior em uma escola na Vila Sônia, na Zona Oeste de São Paulo, a professora de ...


Responsável por parar o agressor e evitar uma tragédia ainda maior em uma escola na Vila Sônia, na Zona Oeste de São Paulo, a professora de Educação Física Cinthia Barbosa, de 37 anos, é ex-jogadora profissional de basquete e já deu aula na Fundação Casa, justamente para onde o adolescente foi encaminhado após o atentado. Docente na Escola Estadual Thomázia Montoro há pouco mais de dois anos, ela conta que agiu intuitivamente quando tentou dominar o agressor.

– Foi um instinto, não esperava isso [o ataque] em uma escola – disse Cinthia, em entrevista ao Estadão.

Imagens de câmeras de segurança da escola mostram a professora imobilizando o aluno, de 13 anos, com um mata-leão, impossibilitando que ele continuasse a desferir golpes na professora Ana Célia Rosa, uma das quatro pessoas que ficaram feridas – uma outra docente, de 71 anos, não resistiu. Enquanto isso, a coordenadora pedagógica Sandra Mendes retirou a faca da mão do aluno.

BARULHO ALTO
Cinthia conta que chegou por volta de 6h50 na escola na segunda-feira (27), dia do atentado. Após pegar o material na sala administrativa, foi ministrar uma aula para o 7º ano. Pouco depois, começou a ouvir um barulho alto vindo de fora.

– Até pensei que fosse a dinâmica que algum professor estivesse utilizando, porque às vezes a gente faz rodas de conversa entre alunos e afasta as carteiras. (…) Mas o barulho não cessava, não passava, estava continuando.

Cinthia fechou a porta e foi correndo em direção às escadas. A professora explicou que a escola tem dez salas de aula: cinco no andar de baixo, onde ela estava dando aula, e a mesma quantidade em cima, de onde vinham os gritos.

A professora disse que hesitou por alguns segundos, mas que ainda assim decidiu ir para onde tinham indicado que estava ocorrendo os ataques: na terceira sala do corredor. Segundo a polícia, o atentado teve início por lá – onde a professora Elisabete Tenreiro foi assassinada -, depois o agressor teria se dirigido para uma segunda sala e, na sequência, voltado para o local onde tinha começado.

ALUNO
– Fui lá e, quando olhei de frente, vi a professora Elisabete deitada no chão. E a Ana Célia estava com ele, que estava segurando a Ana Célia e esfaqueando a professora. (…) Aí eu tentei parar, fui por trás e segurei ele. E aí minha coordenadora, Sandra Mendes, já entrou na sequência. Aí falei para ela: “Tira a faca, tira a faca, tira a faca”. Ela tirou a faca dele e abaixou a máscara. Retirou a touca e viu que era nosso aluno.

Essas imagens foram capturadas por câmeras de segurança da escola. Cinthia contou que, na sequência, ela e o aluno se desequilibraram e caíram no chão, mas a professora continuou o imobilizando.

– Perguntei para ele: “Você tem mais alguma coisa? Está com mais alguma arma?”. Ele falou não. Perguntei se estava sozinho, ele disse que sim. Aí, já levantei e levei ele lá para fora para a gente descer para a sala da direção da escola.

CHEGADA DA POLÍCIA
A professora disse ter mantido o aluno por lá até a chegada da Polícia Militar, minutos depois. Nesse meio tempo, Cinthia contou que foram poucas as palavras que o aluno disse.

– Eu lembro que algumas coisas ele até falou, que queria vingança por causa de bullying, ele falava que já queria fazer isso por algum problema com a família, alguma coisa assim ele falou – afirmou.

Cinthia contou que, quando entrou na sala de aula para conter o agressor, não conseguiu determinar qual era o estado de saúde das professoras.

– Eu só queria tirar ele dali, fui para tirar ele dali. Não me atentei de fato se a professora Bete [Elisabete Tenreiro] estava desmaiada – disse.

Só depois, contou a professora, ela foi ter dimensão do que tinha acontecido na escola. Um dia depois do enterro de Elisabete Tenreiro, ela relembrou da professora com carinho.

– Ela era bastante comunicativa, a gente se falava sempre. (…) Logo que ela entrou na escola, estava sem armário ainda. E eu falava para ela para pôr as coisas no meu. Aí, a gente compartilhou por um tempo o armário.

HEROÍNA
Ainda na segunda, após a repercussão das imagens de Cinthia e Sandra contendo o agressor, o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, chamou as duas de “heroínas”.

– Eu não me enxergo dessa forma. Acho que a nossa função como professora é poder estar auxiliando os alunos em tudo que é possível – disse ela, que descreve o autor dos ataques como introspectivo.

Antes de lecionar, ofício que exerce há quase cinco anos, Cinthia dedicou a carreira ao basquete e deu aulas na Fundação Casa, para onde o agressor foi encaminhado. Cinthia disse que não pretende se deixar desanimar de dar aula.

– Eu penso que eu tenho que ter força. A gente cria planos, cria sonhos, infelizmente esse é um processo muito grande. (…) Voltar depois do que aconteceu não é uma readaptação tão simples. Eu perdi uma companheira de trabalho diretamente. Não posso falar que vai ser fácil, que vai ser difícil, mas eu estou disposta a tentar.

*AE