“Achei que era uma grana fácil, mas agora tô com medo”. Foi dessa forma que a influenciadora Caroline Vieira, de 22 anos, descreveu como s...
“Achei que era uma grana fácil, mas agora tô com medo”. Foi dessa forma que a influenciadora Caroline Vieira, de 22 anos, descreveu como se sente após tomar a arriscada decisão de “vender” o escaneamento das íris de seus olhos para a empresa Tools for Humanity (TFH) em troca de R$ 650 pagos em criptomoeda. A companhia está coletando dados de brasileiros em um processo irreversível e que foi suspenso em países europeus.
Em entrevista à revista Marie Claire, a criadora de conteúdo digital conta que ela e uma amiga estavam com planos de abrir uma loja e precisavam de dinheiro para comprar produtos. Incentivada pela futura sócia, ambas decidiram ir até o bairro do Ipiranga, em São Paulo, onde realizaram o escaneamento de suas íris para obter o dinheiro prometido pela TFH.
O caminho que a gente traçou até lá era muito estranho e deserto. Parecia que o lugar seria totalmente aleatório. Nos vídeos que a gente via na internet, as pessoas faziam as vendas em shoppings ou em lugares mais movimentados, públicos – observou.
Caroline explica que, no local, havia cerca de dez pessoas na fila para passar pelo procedimento, e outros sete funcionários. Na sala de coleta dos dados, estava um aparelho chamado Orb, similar a uma câmera, que escaneia as informações dos olhos dos participantes.
– Para iniciar o processo, você tem que conectar o celular na rede Wi-Fi deles e, depois, assiste algumas imagens explicando sobre a coleta. Fiquei receosa porque é algo novo, mas eles explicam de uma forma tão tranquila que você nem pensa na hora, sabe? – disse ela em entrevista ao portal F5.
Caroline começou a repensar sua decisão quando já era tarde. O arrependimento surgiu quando ela percebeu que o pagamento não seria feito de maneira imediata, podendo levar meses para ser concluído.
– Consegui sacar R$ 196 após 24 horas. Depois dessa primeira parcela, eles podem disponibilizar o resto das criptomoedas em até 11 parcelas. Não dá nem R$ 50 por mês – queixou-se.
A preocupação com as consequências de sua atitude veio após a jovem publicar um vídeo falando sobre o tema nas redes sociais e receber uma enxurrada de comentários negativos. Em poucas horas, a gravação acumulou 3 milhões de visualizações e muitas críticas.
– Eu imaginei que o assunto ia render, mas tomei um susto com a proporção negativa que recebi. Na minha cabeça, estava fazendo algo que não ia afetar em nada no meu dia a dia – comentou.
Caroline afirma que depois de ser alertada pelos internautas, passou a pesquisar sobre os riscos de expor seus dados sem poder garantir de que maneira serão usados.
– Agora que entendi sobre o que se trata a empresa, acho perigoso sim. Tenho receio do que podem fazer com a minha íris no futuro, não dá para saber – ponderou.
PROJETO WORLD
O procedimento em questão é chamado Project World e visa criar o que o chefe de Operações da Tools for Humanity no Brasil, Rodrigo Tozzi, chama de “prova de humanidade”. Tozzi garante que o método é “seguro” e que permitirá a verificação de que você é um ser humano único na internet, protegendo o usuário de fraudes e hackers.
– Ela [a íris] possui uma confiança maior do que outras biométricas, como impressões digitais ou reconhecimento facial, tornando-a menos suscetível a mudanças causadas por fatores externos e, portanto, mais confiável. Com a verificação da íris, não há necessidade de solicitar informações pessoais, como nome, endereço ou documentos. O código gerado a partir da íris é tão sensível que até pequenas variações na textura resultam em códigos completamente diferentes, garantindo a singularidade de cada indivíduo. Mesmo entre gêmeos idênticos, as íris têm aparências completamente distintas – argumentou.
Especialistas, contudo, alertam que permitir a coleta de dados das íris é diferente de gerar uma senha por ser uma informação biométrica que possibilita identificar uma pessoa para o resto de sua vida.
– Por isso, essa coleta desenfreada, sem intenção clara de uso, preocupa tanto sob o ponto de vista de privacidade quanto de direitos humanos. Um dos princípios da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) é a transparência, mas, ainda hoje, não temos visibilidade clara de como esses dados serão utilizados pela tal empresa e/ou se serão associados a sistemas de Inteligência Artificial – advertiu a engenheira de dados, Carla Vieira.
Em nota, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), ligada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, afirmou que abriu um procedimento em novembro de 2024 a fim de “investigar o tratamento de dados biométricos de usuários no contexto do projeto World ID”. Segundo o órgão, a TFH encaminhou os documentos solicitados, que estão em processo de análise.
Por: Pleno.News